segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

A uma amiga distante

Está sendo uma semana difícil, ainda mais agora que conversamos. Além de ser a semana do meu aniversário, estou relembrando de muitas coisas. E como não consegui dormir essa madrugada pensando em tudo o que aconteceu, resolvi escrever (é assim que as coisas se solucionam dentro de mim).

Lembro que foi na semana do seu aniversário (ou um pouco depois) que tudo aconteceu. A sequência dos fatos segue confusa na minha cabeça. Lembro de ter visto aquela parede e saído da sala imediatamente. Fui ao banheiro, liguei para minha mãe e disse "me tira daqui, por favor, mãe, me tira dessa escola". Depois disso eu perdi a relação temporal da situação, me lembro de flashes apenas e sempre intercalados com a lembrança do escrito na parede. Os funcionários da escola me interrogando para falar quem tinha feito aquilo, eu me recusando a dizer. Minha mãe chamando meu pai para ir até à escola com ela. Imagens na parede. Eu, meu pai e minha mãe numa pizzaria jantando, enquanto eles resolviam o que deveriam fazer e eu implorando para que não fizessem um boletim de ocorrência. Porque você já era maior de idade e isso alteraria drasticamente as coisas. Eu me resistindo a acreditar no que estava acontecendo. 
A única coisa que conseguia pensar era "o que eu fiz para ela me odiar tanto? Será que fui tão grossa ao responder àquela pergunta que o fulano me perguntou e ela tirou sarro? Será que falei alguma coisa que não devia? Por que ela me odeia tanto, o que que eu fiz de errado?" Dizem que sempre que esse tipo de coisa acontece, a gente tende a se culpabilizar, como se a sua ação fosse justificada por um erro meu. E demorou muito para eu entender que o movimento não era esse. E nunca esperamos que o preconceito, racismo, homofobia etc etc venham de alguém que nos era tão próximo e querido, talvez por isso tenha doído tanto. Se fosse alguém aleatório, com quem eu não me importasse, talvez aquilo não me afetasse tanto... Mas tinha sido você. 
Sim, você, a pessoa com quem eu saía, com quem eu conversava e me identificava, que eu ia na casa fazer pão de canela, que me mostrava coisas novas, que dividia angústias, que me fazia rir, que falava de coisas interessantes e não era como quase todo mundo da sala, fútil e entediante. E mais importante, a pessoa que me fez sentir como se eu realmente pertencesse a algum lugar, porque desde que eu havia saído do Fênix, eu me sentia completamente deslocada naquela escola. Sim... Essa pessoa tinha me apunhalado pelas costas e eu nem sabia o motivo do golpe. 
No começo eu me culpei, porque pensava que eu tinha te provocado, eu tinha feito algo muito errado e aquilo seria sua "vingança". Depois passei a negar que era você, não acreditava e preferi pensar que poderia ter sido qualquer um. Mais tarde tentei encontrar motivos, uma briga não justificaria aquilo (e nada justifica), mas não encontrei uma pista sequer. Com aquele ano chegando ao fim, decidi ter raiva de você, pensei que assim poderia me libertar daquelas frases escritas que insistiam em me perturbar a memória. Fiz um grande esforço para sentir raiva e te odiar. Deve ter durado uma semana, ou menos. Não conseguia, assim como não consigo agora. Eu gostava muito de você para te odiar, gostava muito da nossa amizade para deixar que a raiva apagasse tudo. 
A única coisa que sobrou foi certo pânico que ainda me acompanha, mais que tristeza, pois me paralisa... Eu não sei se fiquei mais forte com o que aconteceu, faz tanto tempo que coisas ruins estão acontecendo que não tenho tido tempo para fazer balanceamentos e ver progressos, embora acredite que aprendi a suportar melhor, a ir mais devagar e não confiar em todo mundo tão rápido. A não me abrir tão depressa...

De qualquer forma eu fico aliviada que tivemos a chance de conversar, ainda que depois de 4 anos. Por saber que não era a mim quem você odiava, era "apenas" um descompasso entre o que você era (e não aceitava) e o que você demonstrava ser. E, sobretudo, fico feliz por não ter conseguido te odiar, porque assim hoje eu posso dizer, sem esquecer do que aconteceu (isso eu temo ser impossível), mas sabendo exatamente o quão sincero e sofrido é dizê-lo. Eu te desculpo. 

E caso um dia venhamos a nos ver de novo, vou cobrar aquele abraço. 









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