quinta-feira, 9 de maio de 2013

We've been to the top, we've been to the bottom...

Nascemos sozinhos no mundo. Completamente nus, alguns encharcados de sangue, outros com meros respingos. Choramos como que condenados injustamente e nos calamos como quem se conforma. Cortam-nos a única coisa que nos ligávamos de fato a alguém, fazem um curativo nos obrigando a superar a perda e elaborar o trauma. Pronto, daí para frente estamos sozinhos, atônitos, plenos, vazios, estupefatos, sozinhos, sozinhos...
Sim, temos uma família, na maioria das vezes. Temos nossos pais, a mãe ou só o pai. E que por um tempo cuidam de nós como se aquela coisa que nos ligávamos no nascimento ainda existisse... Como se ainda fossemos acoplados a "eles". Por alguns momentos pensamos ter amigos, amores, casos, namoros, noivados, casamentos, divórcios, mais casos, mais amigos... Pensamos... Quimera. Voamos "nas asas da Quimera" e assim seguimos o curso da vida.
Mas... Chega uma hora na qual se encontra gelada, sozinha, tremendo de frio e de medo. De frio e de medo... Nessa hora não adianta recorrer aos amigos, já não estão mais lá, tampouco aos amores, foram os primeiros a ir embora. Os pais ainda existem, mas como seres humanos normais [por mais extraordinários que pareçam] que são, possuem seus limites e não conseguem chegar e estender a mão. Nessa hora o vazio é inexorável e infindável, a escuridão é irredutível e amedronta a alma, de modo a sentir a coluna esfriar, esfriar e esfriar até chegar na nuca e imobilizar o pensamento. E finalmente paralisa por completo, sente-se inerte e o único sentimento permitido é a esperança de que uma força aja sobre você.
Sente-se sucumbindo e definhando enquanto seu corpo tenta lutar com espasmos, lágrimas, gemidos rancorosos, não adianta, é incapaz de responder. Está ali, sentada naquele chão frio e a sensação de estar caindo eternamente persiste, afinal, talvez nunca tenha, de fato, estado noutra situação senão a de estar caindo. Sente como se a vida toda fosse um constante engano, de escolhas erradas, pessoas erradas, caminhos errados, passos tortos, decisões falhas, atitudes desvarias. Com falsas esperanças de encontrar uma corda que te segurasse da eterna queda, a qual não se prendia em lugar algum. Segura estas cordas com tamanha vitalidade e alimenta o desejo de viver, percebe tempos depois a corda caindo junto de ti... O tamanho da corda é proporcional ao da expectativa e quanto maior a expectativa, maior parece a infinitude da queda.
Este buraco negro emerge e logo em seguida te devasta. Está sozinha, sentada num maldito lugar onde ninguém consegue te alcançar, onde a impossibilidade de salvação insiste irritantemente e pior, vence. Suas mãos geladas já não esquentam mais e você simplesmente desiste de tentar se manter quente. Apenas permite aquele gelo cruzar todo o seu corpo, percorrer cada veia e levar tudo que julgar conveniente. Cenas já não existem, lembranças são duvidosas, ânimo é mito e mesmo assim o coração persiste na sua tarefa de bombar sangue. As conversas são inconsistentes; os avisos, desnecessários; os conselhos, inválidos; as ajudas... bem, não existem.
Há muito não respira, apenas suspira por decepções e desilusões. Tenta em vão compreender o mundo e suas crueldades. Não se engane, também não é santa. Não sente culpa, não se arrepende, não sente, não fala, não olha... Você desistiu, fechou os olhos e se deixou cair, sem refúgios, fugas, mentiras ou máscaras. Enquanto isso, assiste aos outros passando pelas ruas como se nada estivesse acontecendo e talvez [para eles] não esteja...
Cai
Cai
Cai
E a única coisa que pensa enquanto cai é chegar um instante no qual tire forças de onde achou não existir mais. Espera avidamente pelo instante do qual retirará sua chance de sair dali. A força deverá surgir de um incômodo na boca do estômago, como se levara um soco, subirá pelo esôfago e travará na garganta. Ali ficará por alguns minutos, até atingir o âmago das coisas e te forçar a sintetizar tudo num grito impulsivo e explosivo, poderoso o suficiente para atravessar tempo e espaço, para tirar-te da inércia, para te fazer levantar, por-se à luz do sol, levar uma das mãos sobre os olhos para tampar um pouco da claridade que fere a face toda trancada na escuridão. A outra mão se estenderá para cima e se apoiará na borda do buraco, até que se levante plenamente.
Quando esse instante chegar, você sentirá apto a viver novamente, a caminhar sabendo que pode tropeçar e terá força para se equilibrar. Contudo, a vida não será mais a mesma. A ilusão não te acompanhará, terá tomado conhecimento de que está sozinha e sozinha viverá. E assim morremos sozinhos no mundo.

But..."the butterflies are still there"...

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