quinta-feira, 27 de março de 2014

Diálogo póstumo

É um vazio tão grande. Uma dor tão triste. Um desgosto tão amargo... Eu sei que amanhã será outro dia, Carlos, sei ainda que o primeiro amor passou é que o segundo provavelmente também. "Mas como dói". Como "amontoar tudo isso num só peito de homem"? É pesado demais. Por mais que eu tente, enfrentar a realidade, no momento, ainda não consigo. O que devo fazer então? Recorrer às ilhas que convocao ao suicídio? Esconder-me em heterônimos de falsos poetas e perder meu tempo com mentiras infundadas? 
Não sei mais o que fazer... Só viver também não dá, deste modo arbitrário e sem sentido. 
"sem nenhum apoio
no chão ou no espaço,
roídos os livros,
cortadas as pontes,
furados os olhos,
a língua enrolada,
os dedos sem tato,
a mente sem ordem,
sem qualquer motivo
de qualquer ação,
tu vives; apenas,
sem saber pra quê,
como para quê,
tu vives: cadáver,
malogro, tu vives,
rotina, tu vives
tu vives, mas triste
duma tal tristeza
tão sem água ou carme,
tão ausente, vago,
que pegar quisera
na mão e dizer-te:
Amigo, não sabes
que existe amanhã?"

Estou esperando esse tal "amanhã" chegar, Carlos. Juro que estou. Mas às vezes tenho vontade de que não chegue nunca e tudo se encerre nesse sombrio hoje no qual venho vivendo. Às vezes desejo que o sol não nasça, que o dia não levante, que meu corpo não desperte de um sono profundo. 
"Que fazer exausto, em país bloqueado 
Enlace de noite, raiz e minério?" 
Estou tentando desatar o labirinto, mas ele me é cada vez mais estranho e a cada dia que passa, sinto-me mais estrangeira. 

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